domingo, 3 de maio de 2009

Mas também se morre

Como eu li em um belo texto escrito pelo Sérgio Roveri, a felicidade tem aquela propriedade de nos blindar dos sofrimentos em relação aos problemas do mundo. Inundados pelo olhar de felicidade, a gripe suína parece apenas um problema distante, a crise econômica parece que não nos atinge, mas às vezes, nem o estado agudo de felicidade nos livra de sermos atingidos pelos acontecimentos.

Hoje, ao chegar em casa com o sol da manhã entrando pela janela, descobri que o diretor de teatro Augusto Boal havia morrido em decorrência de complicações advindas de uma leucemia. Confesso que tal notícia me deixou triste. Para quem gosta da combinação teatro e política e para quem gosta de arte em geral tal notícia entristece.

Boal criou o Teatro do Oprimido, referência em vários países pelo mundo afora, embora pouco reconhecido no país. Sim, ainda pensamos como senhor e escravo, dividimos a sociedade entre a casa-grande e a senzala e lugar de pobre e oprimido para nossas cabeças pequeno-burgesas é na senzala, arte é para uma pseudo elite cultural e estudada, e falar em arte que se pretende transformadora então, é quase uma heresia.

Nesse sentido Boal foi revolucionário, e não apenas por ter criado o Teatro do Oprimido, mas por tudo que fez pelo teatro brasileiro, por ser parte importante da rica história do nosso teatro nadando contra a corrente do senso comum estético, por propor um teatro épico e crítico, por ser o grande diretor do Teatro de Arena nos seus áureos tempos, por ter criado o sistema curinga, um sistema sem hierarquias, sem o protagonista.

Acabo de me lembrar de Clarice Lispector ao relatar a morte de Guimarães Rosa e reproduzo aqui suas palavras: "Desculpem, mas também se morre"

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