quinta-feira, 12 de março de 2009

Tendo a achar que conversas durante a madrugada sempre são as mais interessantes, o motivo de eu ter essa percepção eu nem imagino qual seja, mas o fato é que essa madrugada tive uma conversa que não consigo tirar da cabeça.

Será que sou hipócrita por me considerar uma outsider desse mundo e ao mesmo viver as benesses que esse mundo injusto, por assim dizer, me proporciona? Sempre tive orgulho por não pensar como o senso comum, por ter idéias divergentes em quase tudo que se diz que é consenso, aliás, odeio quando em qualquer discussão alguém vem com esse argumento do consenso.

Alguns exemplos do que estou tentando expressar: não acho que se define um cidadão pelo que ele consome, sou contra redução da maioridade penal, contra a prisão em casos de crime de furto, contra a lógica da eficiência do mercado, a favor da descriminalização da maconha e do aborto, a favor da legalização do aborto, defendo o MST e os movimentos sociais em geral, acho que toma maneira de amar vale a pena, não acho que o amor possa ser colocado em um contrato e muito menos se prender a convenções, prefiro mil vezes a siceridade e a lealdade à fidelidade e mais um monte de coisas que arrepiariam os cabelos de mentes conservadoras.

Mas ao mesmo tempo vivo em um mundo em que todas as relações são reduzidas à mercadoria, um mundo machista, homofóbico, hipócrita. E qual a minha parcela de contribuição para mudar isso? Quase nenhuma, só tenho a minha indignação nas conversas de boteco com os amigos. No mais, vivo as benesses desse mundo, nasci numa família de classe média, fiz duas graduações em uma universidade pública sem precisar trabalhar para me sustentar, vivo da exploração da mais-valia de quem na teoria eu defendo.

Diante disso, eu não seria hipócrita ao defender tais pontos de vista diante da vida que levo? Esse foi o ponto que me intrigou na conversa de ontem e que me fez pensar em muitas coisas. Lógico que tenho minha parte de hipocrisia nessa história, porém a outra possibilidade dada seria agir de acordo com os interesses da minha classe, já que me beneficio de tal exploração, assim não estaria sendo contraditória com o que vivo.

Poderia até ser menos contraditório dizer: "Eu sempre defendi pontos de vista minoritários na sociedade, mas sempre aproveitei das consequências desse mundo injusto, então, para ser condizente com o que vivo, a partir de agora, apesar de discordar, vou passar a defender os pontos de vista dominante, já que não vejo saída para uma tranformação.", mas seria de um cinismo sem precendentes.

Não tenho uma visão ingênua de que apenas com voluntarismo pode-se mudar a ideologia dominante na sociedade, são relações que estabeleceram durantes séculos e que não vão acabar apenas com boa vontade, precisa de um sujeito histórico e de uma correlação de forças favorável, o que estamos bem distante de ter. Entretanto, aceitar que algo construído seja natural é aceitar a dominação, e isso eu me recuso a fazer, prefiro ser chamada de hipócrita.


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